quinta-feira, 27 de novembro de 2014

Entre o céu e o mar


Tudo era como um clichê romântico. Ele tinha aquele cabelo diferente de todos os outros, a camiseta que usava chamou minha atenção e o colar com um pingente em forma de chave pendurado me deixou curioso. Mas a parte clichê está nos olhos. Azuis, não qualquer tipo de azul, mas um azul mar. Desses que você vê dentro de uma onda, quando acerta a manobra com sua prancha e pode ver o céu através dela. Assim se define os seus olhos, e eles definem como eu me sinto a respeito disso.

Esbarrei sem querer com ele enquanto passávamos pela porta do banheiro. A festa estava boa, a música fazia todo sentido, mas estar ali não fazia, pelo menos não pra mim. Água, era isso que eu segurava quando nos esbarramos, porque essa noite eu decidi não beber, disse aos amigos que era porque iria dirigir, mas era uma mentira, eu só não queria fugir de nada, queria ser o Eu mesmo. E graças a ser esse alguém, esbarrei com ele e molhei sua camiseta. Foi aí que ela chamou minha atenção.

Vi que ele não se importou, na verdade fiquei com vergonha demais para olhar em seus olhos e me desculpar. Sempre um desajeitado, atrapalhado e garoto, a pior parte, eu era sempre um garoto. As pessoas com minha idade (26 anos) costumam ser homens, mas não na minha história, não nos passos que eu dou. Eu ainda era um garoto, ingênuo, esperando por alguma coisa e tentando encontrar um brinquedo quebrado e consertá-lo.

Uma hora se passou, e meus amigos continuavam naquele mesmo processo: Bebidas, danças, beijar alguém, faz piada, bebidas, dança... Eu não estava para aquela rotina neste dia, queria apenas ouvir a música e tentar não pensar em nada, sendo somente o Eu mesmo de sempre. E como eu já disse, ser Eu mesmo implica em desastres, e com desastres vêm consequências. E essa veio um pouco mais rápida, talvez não fosse tão ruim assim.

– Eu não iria reclamar, mas você molhou a minha melhor camiseta e...
– Me desculpe, eu nem estava prestando atenção.
– Sim, e este é o problema.
– Não entendi.
– Eu queria que você estivesse, ou pelo menos agora.

Eu não queria olhar nos olhos dele, e aquela luz estava muito baixa para que eu conseguisse percebê-los, mas eu os vi. Azuis, aquele clichê que lhes contei no começo. Caramba, eu nunca havia visto alguém tão bonito, e para ser sincero, eu nem sabia se conseguia formar outra frase depois que ele olhou em minha direção. 

– Estou prestando.

Idiota, qual o seu problema? Eu poderia ter dito algo legal, não sei, talvez elogiar o cabelo dele (Porque aquele cabelo era muito legal), ou o pingente que ele carregava naquele colar. Os olhos não, porque se eu começasse a dizer, ele sacaria na hora que sou uma porcaria de poeta, escritor e falido que aos vinte e seis anos acha que poesia se encaixa perfeitamente bem numa conversa de pessoas normais. Então não disse mais nada, apenas continuei ali. E ele também. 

Mas havia um problema, uma vantagem talvez, e ele sabia bem disso.

– Estou bêbado, você não! Isso não é justo.
– Nunca é. – Ri.
– Então é provável que eu seja um idiota com você em algum momento.
– E se for?
– Você me dá outra chance, porque você me deve... – Ele me observou por um instante, vi seus lábios entortarem em forma de um sorriso tímido, mais sedutor do que deveria ser um pequeno entortar de lábios. – A camiseta, lembra?
– Isso não vale.
– E quem disse as regras?
– Ninguém, mas sei que você está roubando.

Ele sorriu, e confesso que aquele era o sorriso mais lindo que eu já vi. Sabe aquela viagem ao campo que você esperou por anos? Aliás, que você esperou durante todo o ano, afinal você já conhece o lugar. Assim como eu conheço aquele tipo de sorriso. Então, você chega a noite ao seu destino, porém não se tem muito o que fazer por aqui, você dorme. Pela manhã, no primeiro cantar do galo, você se levanta, e abre a janela. Então, atrás da montanha mais distante, em meio ao pequeno brilho azul celeste que se forma, você o vê brilhar. Devagar, silencioso, preguiçoso e perturbador. O sorr..digo o Sol brilha mais forte que qualquer coisa ali, então toda a sua espera ganha sentido.

Chega um momento que a música alta não te incomoda mais, na verdade, o momento aconteceu quando me dei conta de o porquê precisava ser Eu mesmo nesta noite. Conversamos durante um bom tempo, e claro que eu queria que esta noite não tivesse um fim, mas também sabia que não faria sentido fazer alguma coisa naquele dia. Eu estava na vantagem, lembra? E me aproveitei bem dela, fiz o meu jogo.

– Preciso ir embora.

Ele continuou em silêncio por alguns segundos, que para mim pareceu horas. Tomou mais um gole de sua Budwaiser e sorriu para mim (maldito nascer de sol). 

– Você vai anotar o meu número, ou terei que contatar o google e descobrir o seu nome no facebook?
– Eu vou anotar o seu número, e somente isso.
– Talvez você precise do meu nome.
– Talvez você me diga outro dia.
– E se tudo isso não tiver sido real?
– Aí eu acordarei de muito mal humor.

No meu carro eu dirigi devagar, não olhei para que horas eram, mas o celular não saiu das minhas mãos. Eu tinha o número dele, e talvez devesse escrever uma mensagem e dizer algo, falar para ele onde morava e que podia ir lá naquele momento mesmo. Eu não queria dormir sozinho, não agora, não depois daquele sorriso. Mas não é assim que se joga, e eu precisava ganhar dessa vez. Porque mesmo com todas as vantagens que eu tinha, ele me venceu. Eu tinha certeza disso.

Nem ao menos sei o seu nome, mas o número continua ali. Acho que o problema de estar dentro de uma onda numa manobra perfeita, é que o céu se torna uma cor que só você consegue distinguir. E era assim que eu me senti a respeito dele, como um mar me envolvendo e céu se transformando num azul jamais visto antes.

Não faço ideia de seu nome, mas ainda gostei do seu cabelo, daquela camiseta e o pingente. Os olhos clichês, o sorriso torto e a pior parte, ele me fez prestar atenção.

Amanhã escreverei uma mensagem.

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quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Invernos, eternos

Ele nunca vai dizer que a ama. Porque ela não quer que isso aconteça. Se ouvisse tal frase, pegaria seu casaco que está pendurado atrás da porta (porque o inverno fez questão de chegar mais cedo nesse ano), sairia e jamais voltaria ali. E nem se preocuparia se foi ele quem a buscou na sua casa, um táxi, um ônibus, até mesmo andar todo aquele percurso, seria melhor do que ter de encará-lo após dizer tal asneira.



Por mais que a frase esteja presa em sua língua, ele sabe bem como as coisas funcionam. E no mundo real as pessoas que sentem demais acabam ficando para trás. Então começou a dizer que gostava dela, não com os lábios, porque isso demonstraria fraqueza. Disse com os seus olhos castanhos quaseClaros-nemTãoEscuros, e continuou a dizer enquanto beijava o pescoço dela.



Ela, bem, ela não tinha como se opor aquilo. Estava escrito bem grande em volta dele, com um letreiro piscando e até mesmo fazendo um barulho, ele a amava. E por mais que não concordasse com aquilo, ela também se sentia da mesma forma. Mas a vida lhe ensinou a mentir, a esconder todo e qualquer sinal de fraqueza que o sentimento pudesse lhe transparecer. E assim o fazia, e muito bem.

Não sei dizer qual era o problema com aqueles dois. Na verdade não existia um, ou ao menos, não um que valesse de tanta importância. Ele é um brinquedo quebrado, procurando por um pedaço de parafuso que aceite que sentimentos sejam mais importantes que qualquer regra ridícula. Já ela é uma linda caixa de música, completa, fechada a espera que sua bailarina não caía quando começar a girar. Quer que ele seja quem dê corda naquela canção, mas não quer dizer isso, nem quer que lhe seja perguntado.

Há um grande problema e um caminho muito perigoso entre o dizer e o não dizer. É como se aquilo que não é falado, fosse deixado de lado e perdesse a importância. Porém, quando esse é dito, faz com que toda a importância e mistério do “não dito” seja perdida. Regras ridículas, e sentimentos vazios.

Ela quer mesmo que ele mantenha a boca fechada. Mas todo dia se pergunta o quão importante tudo aquilo é pra ele. Já ele cisma em querer dizer tudo, mas não sabe se ela vai querer ouvir, ou se está pronta para tais palavras. 

É nessa hora que descobrimos o sentido do beijo. Sim, é este tal que diz o que é e o que não é no meio dessa confusão. Cada mordida que ela sente em seus lábios, é uma incerteza que se vai, enquanto cada toque aos lábios dela, é uma vontade que aumenta no peito dele. E o sexo poderia demonstra onde está toda a paixão daqueles dois, mas só o beijo diria se era amor ou não.

E ele sempre vai dizer que a ama. Por mais que ela odeie toda essa coisa. Os olhos castanhos quaseClaros-nemTãoEscuros quando se encontram com os olhos dela MuitoVerdesparaSeremAzuis-AzuisDemaisParaseremVerdes diz muito mais do que ela gostaria de ouvir. E a melhor parte de tudo isso, é entender que ela não tem de ouvir nada, apenas assentir com o olhar. Poderia dizer que esse era um jogo perigoso. E, não que ela fosse assumir isso, ele sabia jogar muito bem.

Mas em meio a um descuido perigoso (maldita hora em que o sorriso surgiu e todas as coisas fugiram de seu controle), os olhos ficam presos um ao outro, as mãos dele segura o rosto dela, enquanto as dela tocam a pele do braço dele. Os lábios tomam uma pequena distância e então aquilo lhe foge da boca.

– Eu te amo!

Então ele o fez. Deu a corda na caixa de música enquanto ela decidiu ser o parafuso. Aquele sussurro saiu dos lábios dela, e não dava pra acreditar que isso fosse possível. Ele era quem deveria ser o sentimentalista, ela estava presa atrás de vários muros, não deveria dizer nada, mas o fez. E aquilo pareceu fazer ainda mais sentido quando dito em voz alta.

Ele sorriu. Jamais responderia com algo que pudesse parecer um resposta cordial para tal coisa. A abraçou, aproximou-se de sua orelha e o mais suave que pôde sussurrou:

– Espero que você não tenha hora para voltar. Porque daqui você jamais irá sair.

Agora já fazem mais de três invernos. E aquele casaco continua pendurado lá. As vezes o dele abriga atrás da porta da casa dela e assim tem sido desde então. Hoje em dia ele costuma dizer que a ama, e gosta de fazer isso em alto e bom tom, para que ela não tenha como fingir que não ouviu. E ela as vezes acha que deveria ter ido embora naquele dia, mas algo lhe disse que jamais se perdoaria se o tivesse feito. E por mais que insistisse que conseguiria fazer isso, com ou sem o consentimento dele, sabia que a porta sempre estaria fechada, e que ele jamais a deixaria partir. Na verdade, ela faria o mesmo por ele.

Malditos casacos pesados. Invernos adiantados. Eternos namorados.

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segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Devolvo as memórias...

Lembra quando nos conhecemos?

Você riu da minha forma de andar, e eu achei estranho aquela sua camiseta com uma bandeira desenhada nela. Não que as pessoas sejam proibidas de idolatrar outras pátrias, ou qualquer coisa do tipo, só achei interessante o contexto. Mais tarde eu saberia que era mais um objeto de “moda” do que algo referente a algum país.


Você não falou comigo, mas sei bem que queria segurar minha mão. E depois de algumas conversas, você o fez. Fiquei me perguntando se isso aconteceria e como seria se acontecesse. E por mais que eu tivesse criado mil e uma possibilidades em minha mente, nenhuma delas era páreo para aquele seu sorriso de dentes pequenos, o olhar miúdo e o jeito doce de falar que você usou antes de tocá-las.

Ali, eu tive certeza que era amor. Somente ali, em nenhum momento antes ou depois daquele minuto. Foi naquela hora que eu soube e disse a mim mesmo “agora tudo vai começar a fazer sentido”, eu estava certo.

Foi amor quando você me abraçou pela primeira vez. Sem jeito, um pouco mais alto que eu e desajeitado em meio a tudo aquilo. Era tímido sim, mas escondia uma necessidade que queria escancarar toda uma vontade. Aquele abraço falava por nós dois e nele eu tive a certeza que seria você com quem eu passaria todos os meus dias.

Engraçado todos esses detalhes que nunca sumiram e nem vão parar de dançar em minha mente. Já faz algum tempo desde o nosso último “vamos fazer dar certo dessa vez”, mas nada mudou em questão disso. Continuo despreparado para enfrentar um mundo com você e você, bem, eu tenho certeza que continua com aquela mesma mania de gritar quando não concorda com algo.

Sobre o amor, não sei como ele funciona. Mas sei que ele funciona.

Não faz sentido algum toda essa história. Muito menos sentido me questionar sobre meus erros e nem sequer querer saber sobre os teus. Sempre fui assim não é mesmo? Querendo consertar até quando não fui eu quem quebrou, esse é meu jeito de fazer as coisas.

Eu queria que você me devolvesse as coisas que ficaram com você. E não estou falando daquelas que ficavam em cima daquela estante no seu quarto. Falo das coisas que me pertencem, mas nunca pude pegar de volta. Pra começar, queria saber onde está minha razão, a perdi há muito tempo atrás, quando encontrei os seus olhos pela primeira vez.

Eu gostaria muito, que você me devolvesse as certezas. Deixasse com as clarezas e crenças que todas as coisas podem, e vão, dar muito certo. E quando você me entregasse meu pacote de certezas, eu lhe devolveria um pacote cheio de medos que você deixou aqui comigo. Isso não tem serventia pra mim, mas vive ocupando espaço em um canto do meu quarto, e eu não consigo jogar fora.

Eu queria que você me devolvesse o tempo. Os minutos em que senti sua falta, as horas e dias que esperei você voltar e fazer de tudo aquilo apenas um sonho ruim que iria ficar no passado. Mas olha que coisa mais injusta, você não voltou e a única coisa que ficou no passado foi aquela sua camiseta desenhada com a bandeira de um país.

Caramba, eu nem sei porque você vem a minha mente toda as vezes que essas coisas acontecem. Toda vez que quebro algo, é como se eu apontasse o dedo no seu rosto e te culpasse por tudo isso. Porque afinal foi você quem me deixou assim. Sei que grande parte disso é culpa minha também, mas me sinto melhor em dizer que Só você que estragou tudo.

Eu queria que você me devolvesse tudo isso. Que me devolvesse o dia que não falou comigo, mas quis segurar minha mão. Devolvesse o sorriso tímido que mirou em minha direção e me fez ser seu dali em diante. Os seus olhos pequenos, lhe pertencem, eu sei, mas aquele brilho era somente meu, e eu o quero de volta.

Eu queria que você de me devolvesse todos os dias.

Devolvesse-me todas as memórias.

E me devolvesse o “agora tudo vai começar a fazer sentido”.

Porque faz muito tempo que nada orna com nada, e continua sem combinar a cada passo que nos distanciamos um do outro. É tão complicado fazer sentido, quando nada mais parece certo. Nem mesmo parágrafo se encaixa em parágrafo numa mesma história, tudo fica desorganizado.

Eu sei, pode parar de fechar essa cara, e agir como se eu só estivesse dizendo bobagens. Eu sei o quê tudo isso é. E sei que não faz diferença alguma. Mas ainda sim faz falta dizer.

Caramba, nem sei onde cheguei com toda essa história. E nem sei pra onde vamos se eu continuar daqui. Eu gostaria somente que você respondesse as minhas perguntas, e então devolvesse o que me pertence. Mas parece que me perdi, novamente, eu sei.

Nunca consigo falar sobre você, e nem ao menos gosto de fazer isso. Você se lembra quando eu te disse que deveríamos ser namorados? E você sorriu insistindo que era tudo o que mais queria na vida. Lembra quando Frejat tocava uma música somente nossa, e que só teve sentido quando nos encontramos? Caramba, você lembra que gostava de me ver de chinelos e bermuda, porque gostava de pensar que eu estava à vontade contigo?

Ei, você se lembra da praia? Da lua? E quando, depois de toda a mágoa, disse que me amava?

Você se lembra de nós dois?

Lembra o porquê chegamos aqui hoje?

Você se lembra que eu nunca quis ser mais do que tudo que éramos? E mesmo assim você insistia que devíamos tornar tudo aquilo ainda mais sério. Com um cachorro e duas crianças.

Caramba, eu me lembro de tantas coisas agora.

E só gostaria de saber se você se lembra de quando nos conhecemos.

Porque já faz tanto tempo que não te conheço mais.

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