quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Invernos, eternos

Ele nunca vai dizer que a ama. Porque ela não quer que isso aconteça. Se ouvisse tal frase, pegaria seu casaco que está pendurado atrás da porta (porque o inverno fez questão de chegar mais cedo nesse ano), sairia e jamais voltaria ali. E nem se preocuparia se foi ele quem a buscou na sua casa, um táxi, um ônibus, até mesmo andar todo aquele percurso, seria melhor do que ter de encará-lo após dizer tal asneira.



Por mais que a frase esteja presa em sua língua, ele sabe bem como as coisas funcionam. E no mundo real as pessoas que sentem demais acabam ficando para trás. Então começou a dizer que gostava dela, não com os lábios, porque isso demonstraria fraqueza. Disse com os seus olhos castanhos quaseClaros-nemTãoEscuros, e continuou a dizer enquanto beijava o pescoço dela.



Ela, bem, ela não tinha como se opor aquilo. Estava escrito bem grande em volta dele, com um letreiro piscando e até mesmo fazendo um barulho, ele a amava. E por mais que não concordasse com aquilo, ela também se sentia da mesma forma. Mas a vida lhe ensinou a mentir, a esconder todo e qualquer sinal de fraqueza que o sentimento pudesse lhe transparecer. E assim o fazia, e muito bem.

Não sei dizer qual era o problema com aqueles dois. Na verdade não existia um, ou ao menos, não um que valesse de tanta importância. Ele é um brinquedo quebrado, procurando por um pedaço de parafuso que aceite que sentimentos sejam mais importantes que qualquer regra ridícula. Já ela é uma linda caixa de música, completa, fechada a espera que sua bailarina não caía quando começar a girar. Quer que ele seja quem dê corda naquela canção, mas não quer dizer isso, nem quer que lhe seja perguntado.

Há um grande problema e um caminho muito perigoso entre o dizer e o não dizer. É como se aquilo que não é falado, fosse deixado de lado e perdesse a importância. Porém, quando esse é dito, faz com que toda a importância e mistério do “não dito” seja perdida. Regras ridículas, e sentimentos vazios.

Ela quer mesmo que ele mantenha a boca fechada. Mas todo dia se pergunta o quão importante tudo aquilo é pra ele. Já ele cisma em querer dizer tudo, mas não sabe se ela vai querer ouvir, ou se está pronta para tais palavras. 

É nessa hora que descobrimos o sentido do beijo. Sim, é este tal que diz o que é e o que não é no meio dessa confusão. Cada mordida que ela sente em seus lábios, é uma incerteza que se vai, enquanto cada toque aos lábios dela, é uma vontade que aumenta no peito dele. E o sexo poderia demonstra onde está toda a paixão daqueles dois, mas só o beijo diria se era amor ou não.

E ele sempre vai dizer que a ama. Por mais que ela odeie toda essa coisa. Os olhos castanhos quaseClaros-nemTãoEscuros quando se encontram com os olhos dela MuitoVerdesparaSeremAzuis-AzuisDemaisParaseremVerdes diz muito mais do que ela gostaria de ouvir. E a melhor parte de tudo isso, é entender que ela não tem de ouvir nada, apenas assentir com o olhar. Poderia dizer que esse era um jogo perigoso. E, não que ela fosse assumir isso, ele sabia jogar muito bem.

Mas em meio a um descuido perigoso (maldita hora em que o sorriso surgiu e todas as coisas fugiram de seu controle), os olhos ficam presos um ao outro, as mãos dele segura o rosto dela, enquanto as dela tocam a pele do braço dele. Os lábios tomam uma pequena distância e então aquilo lhe foge da boca.

– Eu te amo!

Então ele o fez. Deu a corda na caixa de música enquanto ela decidiu ser o parafuso. Aquele sussurro saiu dos lábios dela, e não dava pra acreditar que isso fosse possível. Ele era quem deveria ser o sentimentalista, ela estava presa atrás de vários muros, não deveria dizer nada, mas o fez. E aquilo pareceu fazer ainda mais sentido quando dito em voz alta.

Ele sorriu. Jamais responderia com algo que pudesse parecer um resposta cordial para tal coisa. A abraçou, aproximou-se de sua orelha e o mais suave que pôde sussurrou:

– Espero que você não tenha hora para voltar. Porque daqui você jamais irá sair.

Agora já fazem mais de três invernos. E aquele casaco continua pendurado lá. As vezes o dele abriga atrás da porta da casa dela e assim tem sido desde então. Hoje em dia ele costuma dizer que a ama, e gosta de fazer isso em alto e bom tom, para que ela não tenha como fingir que não ouviu. E ela as vezes acha que deveria ter ido embora naquele dia, mas algo lhe disse que jamais se perdoaria se o tivesse feito. E por mais que insistisse que conseguiria fazer isso, com ou sem o consentimento dele, sabia que a porta sempre estaria fechada, e que ele jamais a deixaria partir. Na verdade, ela faria o mesmo por ele.

Malditos casacos pesados. Invernos adiantados. Eternos namorados.

Marcadores: ,

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial