terça-feira, 28 de março de 2017

Eu não queria escrever...


Eu não queria ter que escrever isso sobre você...

Não queria porque um par de olhos castanhos não ficam tão bonitos num pedaço de papel, onde não há brilho. Só há o vazio de brancos e brancos esperam por mais palavras. Estas que ficaram presas em minha garganta quando teus olhos estavam nos meus.

Eu não queria ter te encontrado num fim de tarde, visto um filme bom, mesmo você odiando pipoca e eu concordando em pegar só um refrigerante. Porque eu queria dizer pra mim mesmo que você não poderia exercer poder nenhum sobre mim, sem nem ao menos me conhecer. Aí você sorriu.

Sorrisos, grandes trapaceiros, a armadilha que prende a pata de um enorme urso na selva. E esse, pobre coitado, de nada adianta tentar se debater. É forte, soberano, mas está preso em um engenharia que o ser humano, menor e com menos força, inventou para acabar com sua vida. É isto que me lembra o sorriso teu, uma truque que tira minhas forças.

Eu não queria que você conhecesse o meu íntimo numa noite sem muito o quê fazer. Apenas alguns amigos, comidas e filmes velhos sobre adolescentes. Músicas antigas, coreografias de infância. E muito dos teus olhares vendo como eu sou quando sou apenas o Eu de sempre. E você gostou de mim assim.

Você não queria que eu ganhasse nenhuma discussão com você. Nem cheguei a pensar sobre o assunto, mas era óbvio que discutiríamos. E o mais irônico disso, eu venci. Você gostou sim de dormir abraçado comigo, mesmo dizendo que preferiria que cada um dormisse em um lado da cama. 

Eu nem queria lembrar da sua cabeça em meu ombro. Quando você insistia que eu era seco e não demonstrava o que sentia. Quando você dizia que eu não falava nada. E eu só queria estar ali, te abraçar ali, olhar para aqueles castanhos que não tem brilho aqui, mas que brilhavam num infinito quando se encontrava com os meus azuis.

Eu não queria te abraçar por uma última vez. Nem voltar pra casa reafirmando que este é só o começo. Eu não gosto de intervalos, meu peito também não. Gostaria que fosse nós agora e pronto. Nós como os que você deu na minha cabeça quando sorriu.

Por fim, eu não queria dizer tchau, até logo, adeus ou qualquer derivado disso. Porque amanhã o sol nasce aqui pra mim, enquanto pra você já terá acontecido cinco horas antes. Essa é nossa distância: horas. Gosto de pensar assim.

Mas é pelo papel em branco que 
As letras se misturam e se conhecem

Porque eu nunca quis escrever algo assim sobre você.
E de pensar que saudade é uma forma de gostar muito de alguém.

Você se foi, levando um pouco de mim.
Deixando um pouco de ti comigo também.

E o que eu tenho a dizer sobre tudo isso é:
Até logo e fica bem!

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segunda-feira, 20 de março de 2017

Tem a ver com Esperança


Outro copo de cerveja, mais três música e hoje a festa termina assim. No carro dele, de todas as músicas que poderia selecionar sobre ela, a que toca é aquela canção que tocava quando eles ainda eram alguma coisa mais que estranhos.

Mais uma manhã, uma nova dor de cabeça e outros comprimidos com nomes que ele nunca imaginou existir. As semanas eram tão grogues e ficam sempre sob tantos efeitos de aspirinas que sempre voava e o dia terminava antes que ele se desse conta que começou.

Não tem a ver com sentir a falta de um alguém. Tem a ver com não entender o porquê de sozinho ter muito mais sentido. Quando a porta se fecha, alguém do outro lado vai embora e tudo que fica lá dentro é um amontoado de canções, lembranças e gostos que fazem, ou não, sentido.

Quando na rua, andado num desses dias de sol, os dedos não encontram nada além de espaço. E as respirações são ritmadas pelas canções nos fones de ouvido. Ninguém deixa uma mensagem de grande importância, e isso não importa mesmo. Porque é sozinho que tudo tem mais sentido.

Ele nunca achou que responder "onde vai?" fosse tão difícil. Pois antes a resposta vinha antes da pergunta. A satisfação vinha antes da indagação de uma outra pessoa que não muda em nada a direção, nem o ritmo dos teus passos. Ele nunca gostou dessas coisas.

Mas no fim de semana seria como na semana anterior. Um copo e mais três músicas antes da festa terminar. No carro a música é um aconchego sobre pessoas que se tornaram uma só. As canções são sobre ele se pertencer e nada de satisfações.

De manhã vem uma nova dor de cabeça, um par de olhos e boas horas de conversa.

Não tem a ver com sentir a falta de alguém quando você se encontra. Quando o perdido estava o tempo todo trancado dentro da porta do seu peito. Quando a pessoa do outro lado era ele mesmo. Não tem a ver com sentir falta de alguém, quando o Eu que tinha partido.

E então ele se perde em um novo sorriso bobo.
No seu peito vem aquele amontoado de canções, lembranças e gostos.

Mas no fim a outra pessoa também só queria alguns dedos para compartilhar uma caminhada de sol. Sem responder onde vai, porque no fim, eles acabam indo juntos.

Amanhã, talvez ela vá embora, e novas canções terão sentido.
Até lá, o aconchego se torna canção mesmo no silêncio do quarto quando as pernas só se entrelaçam. Quando as páginas ficam em branco e tudo o que ele sente sai da boca e não preenche mais linhas sem sentido.

Não tem a ver com sentir falta de alguém,
Mas com ela aqui, tudo sempre fica bem.

Imagem: ClipartFox

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domingo, 5 de março de 2017

A Traída

Lençóis e pernas se misturam. Uma respiração forte e mais nada além do vazio que ela deixou quando se levantou algumas horas antes daquele dia. Manhã nublada, céu de chuva e mais um pouco de café mal passado que eu fazia sem muita preocupação com o gosto.

Afinal todos os gostos já eram meio amargos num dia como o de ontem. Nem todo o pote de açúcar é suficiente para adoçar o que já estava claro para mim depois de tantos dias sendo a garota dela. Garota estúpida, isso que eu sempre fui. Enquanto presa nesta casa, sentada no sofá, cobertor enrolado no corpo e mais duas ou três xícaras daquele mesmo café.

O ontem era tudo o que eu sempre deixava para trás. Duas, três ou quatro ligações perdidas durante a noite. Ela não atende o celular. Um silêncio. Eu não questiono as horas de ausência, apenas passo mais um pouco de café, ou tomo outra dose do whisky sobre a mesa da sala.

Três da manhã, meu telefone toca. Ela se desculpa do outro lado, mais uma vez pegou no sono e deixou o celular no silencioso. Em todo este tempo juntas, ela ainda acha que eu não notei que o sono dela é tão leve que por vezes me acordava na madrugada pois eu respirava alto demais? Ou será que ela tem tanta certeza que eu vou aceitar qualquer coisa para mantê-la ao meu lado.

A manhã continua de chuva, minhas horas continuam a passar. Cigarros velhos, baseados e qualquer droga era melhor que tudo aquilo. Eu não sei como é o som do choro de alguém que sofre por amor, eu nunca mais ouvi o meu. Minhas lágrimas caem das nuvens lá fora. Aqui dentro eu só fico sendo minha e de mais ninguém.

Durante a noite ela vai chegar. Beijar-me com toda a culpa disfarçada de saudade que sente. Vai me dizer que sou a mulher de sua vida. Porém enquanto beija outras bocas, por dentro, ela ri da garota estúpida que eu sou.

E eu sempre fui assim. Atraída pelo amor. E, bem sei, que todos já me olham sabendo que essa dança é só minha. Nenhum amigo se atreve a dizer. Eles sabem que minha doença de nada tem a ver com amor. É sobre as traições e a maneira como elas me atraem.

Essa noite eu decidi que é nossa última vez. Eu te vi errando tantas vezes, e isso nunca foi pecado. Mas ultimamente isto tem me feito sangrar. E antes que eu possa destruir todo o resto de café quente e doce que ainda existe no meu peito, é a sua língua que vamos queimar.




Lençóis e pernas se misturam. Uma respiração forte e mais nada além do vazio que ela deixou quando decidiu ser a traição de um amor sem fim. Eu, a traída, mais uma vez fiz da chuva sol e nele permaneci.

O amor é como um whisky. Quanto mais gelo você adicionar, menos o sabor você vai sentir. Eu sempre bebi puro e nunca fui garota de adicionar nada, nem ninguém a histórias que só dizem a respeito de duas pessoas.

Três da manhã, meu telefone ainda toca. Mas não sou mais atraída para o mesmo.
Hoje é tudo sobre os lençóis e muito mais espaço para dormir durante a noite.
Minha respiração é alta como as batidas do meu peito.
A saudade continua aqui.
Mas ela não machuca ninguém,
apenas fica exposta naquela velha estante.

A traída, parece uma piada!

Mas agora é só sobre sorrisos,
E portas abertas de mais um dia sem chuva.


Imagem: #GIRLS#

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